Quem quer ser brasileiro?

dez 5, 2011 | 7 Comments

 

A gente já sabe que aquela teologia mencionada no último parágrafo do texto anterior está se enfraquecendo em grande parte do Brasil. Os crentes estão mais próximos do mercado, da rua, da mídia. Sejam crentes católicos ou evangélicos, aqueles que aceitaram a explicação cristã para a vida, já superaram a visão pessimista dos seus pais, o continuo ato de negação da realidade, enfim, aquele ato evasivo que mencionamos para, então, partir numa apressada jornada de assimilação cultural.

Como tudo que é feito de forma apressada, sem reflexão ou espera, o negócio acaba ficando meio desengonçado. Vovó já dizia: “o apressado come cru”. É certo que muito desse processo que começou (entre outros importantes fatos) com a permissão de guitarras elétricas nos cultos, passando pelo afrouxamento das doutrinas de usos e costumes, chegando na inserção da mentalidade de consumo-sagrado de produtos cristãos para benefício espiritual, aderindo aos cinemas, à política, e a tudo que se move e parece bom, muito disso acabou por diluir espaços antes bem demarcados. É comum hoje em dia o pastor abrir o altar, o púlpito, para eventos que nada se parecem com um culto tradicional, nem se projetam para isso; são eventos que misturam entretenimento, artes, vídeos, circo, humor e dança na tentativa de transformar o local de reunião da Igreja num espaço de convivência, onde é colocada em prática a capacidade social de cada membro do grupo e onde também se pratica o evangelismo. Não se sabe mais a diferença entre palco e púlpito, entre teatro e culto, entre palanque e altar. Está tudo se diluindo nesse processo de assimilação cultural, onde a igreja está cada vez mais parecida com o “mundo”.

Tudo isso falei na linguagem mais simples que consegui. Obviamente os estudiosos e sabichões de plantão logo vão surgir  aqui ou no twitter para dar conselhos sobre isso e aquilo na intenção de sofisticar meu argumento. Mas, no momento dispenso qualquer sugestão ou tentação de me parecer intelectual para fulano ou ciclano. Minha vocação é outra. Desejo apenas que o leitor fique cheio de esperança nessa leitura que pode reciclar seus conceitos. Sim! Esperança. Porque consigo ver daqui uma outra geração que, pela Graça de Deus, experimenta o amadurecimento dos crentes no sentido de perceber que não é pela via da negação, nem da assimilação (que dilui os espaços num estranho líquido colorido) , mas é através de uma nova postura de intromissão generosa que podemos então contribuir com alguma beleza para a nossa jovem brasilidade. Ouvindo o mundo, ouvindo o Espírito (como diria Stott) e ‘cair pra dentro’ respeitando os espaços historicamente construídos pela nossa sociedade; culto continuando a ser culto, palco, palco, espetáculo, espetáculo, tudo isso diante da face de Deus.

Mais pra frente quero falar com riqueza de detalhes sobre esses três tipos de brasileiros que ,nascidos ou naturalizados aqui, creram no Evangelho e viveram suas vidas, ou ainda estão vivendo de alguma forma conscientes de que fazem a melhor escolha. No momento, quero lembrar de dois autores que parecem convergir nessa exposição: Gedeon Alencar e Guilherme de Carvalho. Esses termos que usei aqui para traçar as diferenças das três gerações ( 1a Negação, 2a Assimilação, 3a Intromissão) são de Alencar, exceto a 3a que é coisa da minha lavra. O Guilherme aparece para conceituar as três grandes teologias, as mais poderosas tradições de todos os tempos  que ainda fazem a cabeça da moçada e ensinam como o crente deve se envolver com o mundo: Anabatistas ( se envolvem pela via da negação) Luteranos (dois reinos – igreja e sociedade- se envolvem utilizando duas formas de viver) Calvinismo (um reino só; pela via da rejeição crítica associada à invasão redentiva se intrometem no mundo que pertence a um só Rei).

Neste momento, apenas pense nisso: quem pode ser brasileiro? Aquele que se isola do mundo, o outro que assimila a cultura diluindo tudo, ou este que se intromete dialeticamente no meio do povo? É verdade, nenhum desses sujeitos deixou de ser brasileiro legítimo, mesmo que para o primeiro não só o Brasil, mas, o planeta seja um bom lugar para ser abandonado, mesmo tendo o segundo acreditado na perigosa justaposição dos reinos – a igreja dominando a sociedade- todos eles, inclusive os calvinistas e neo-calvinistas tupiniquins continuam sendo dessa pátria, ainda que tenha adquirido outra cidadania pelo direito de sangue que os fazem cidadãos dos céus.  A verdadeira questão talvez seja outra: Quem quer ser brasileiro?

Tenho uma leve suspeita de que Deus, lá no dia do juízo final, vai procurar no meio de todos os  povos, tribos, línguas e nações, o abençoado povo brasileiro. E aí? Onde ele estará?  O raciocínio é simples: para se salvar o Brasil é necessário que aqui existam brasileiros gritando por socorro, que vivam sua brasilidade tecida na Esperança, bem no meio do mundo, sobre este mesmo chão, único, de um Único dono!

Quem quer? Eu quero. Estou nessa!

 

Fique com meu abraço demorado e até mais ver.

Marcos Almeida

Hoje em casa.

Quem pode ser brasileiro?

nov 24, 2011 | 4 Comments

 

Uma pergunta muito importante que dificilmente é colocada na roda dos esclarecedores é esta: quem pode ser brasileiro? Hoje sabemos que muita gente quer estar aqui desenvolvendo seus produtos e explorando nossas riquezas (não só a Chevron) construindo algumas melecas monumentais (pra não dizer cagadas internacionais). Mas, existem outras vontades; e no caso daqueles que desejam ser daqui, como funciona? Temos alguém que fica impedido de ser filho dessa terra?

Alguns já estão pensando agora naquela diferença entre filhos biológicos e filhos adotivos. Mas existe alguma outra paternidade, ou patrialidade que não seja a adotiva? Já que no nosso caso mestiço tão singular somos uma mistura de índios, invasores, exploradores, jesuítas, escravos, comerciantes, protestantes, lavradores, loucos e degredados, todos estrangeiros a exceção dos índios; como, então, definir quem pode e quem não pode ser daqui?

Vamos pegar logo um caso absurdo para os fanáticos do nosso futebol; se o Maradona desejasse uma carta de naturalização, chegasse lá na Polícia Federal com o formulário preenchido, lendo e escrevendo em português, pode um argentino se tornar brasileiro? Pode! Talvez o Maradona, nesta altura do campeonato, nunca deseje ser um dos nossos, mas outro argentino já fez isso há muito tempo. Senhoras e senhores: Meligeni.

Vamos voltar um pouco no tempo.Cinco de Outubro de 1988, Cid Moreira – àquela época há mais de19 anos apresentando o Jornal Nacional – anuncia a histórica reportagem de Alexandre Garcia sobre a nova e atual constituição brasileira: “O Brasil teve até hoje a tarde sete constituições. A oitava já está em vigor”.  Um marco na nossa trajetória, esse dia representa quase que o nascimento de um outro país, uma nova nação que “quer mudar, deve mudar  e vai mudar”, segundo as palavras do presidente da Constituinte, Ulysses Guimarães. Desta geração, que amaldiçoou a tirania e a ditadura, até hoje no século XXI,  vimos algumas instituições democráticas sérias que continuam lutando “contra o arbítrio do Estado”  apesar de acentuada e perigosa inversão de funções entre legislativo e judiciário nesses últimos dois anos – o caso mais tenso a ser lembrado rapidamente foi o “casamento gay” onde o Supremo, ignorando a constituição, determinou mudanças no marco regulatório a respeito do que é a família brasileira. No entanto, se existe um texto fundamental a ser seguido, contestado, discutido, mas nunca  ignorado  a respeito do que é ser brasileiro está aí: a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Os Estados Unidos, é bom lembrar, têm a mesma constituição há 224 anos. Guardando-a como uma verdadeira obra sagrada, seu povo consegue transferir uma herança preciosa e palpável para a nova geração a respeito do que é pertencer a uma pátria, ou do que é ser cidadão americano – sentimento muito mais enraizado do que o nosso neste sentido. Mas, a nossa “Lei de todas as leis”, apesar da sua pouca  idade – 23 anos apenas – é quem tem determinado na esfera jurídica  “quem pode ser” ou quem é  esse cidadão brasileiro num planeta tão diverso (a despeito da tal globlalização) com centenas de povos, tribos, línguas e nações!

Então, se você nasceu aqui já é brasileiro! Só não venha nascer filho de um diplomata ou militar estrangeiro a  serviço no Brasil, porque aí você não entra no time. Se nasceu lá fora e resolveu escolher o Brasil como pátria, é possível; basta seguir os passos do processo de naturalização. Portanto, brasileiro nato ou naturalizado, só existem esses dois tipos de cidadãos  perante a lei. No entanto,meu querido leitor, depois de esclarecer isso tudo, ainda fica uma dúvida: tem alguém que continua impedido de ser brasileiro, mesmo sabendo-se naturalizado ou nascido nesta terra maravilhosa? Sim! Chegamos no ponto mais importante desse texto – que está cada vez mais longo, mas (prometo) cada vez mais quente!

Como cristão  (que vive a Igreja e ama essa família)  vou falar de um tipo de brasileiro que foi impedido de ser daqui não por um governo autoritário ou pela lei constitucional, nem muito menos pelas Escrituras Sagradas. Mas, conduzidos por pressupostos teológicos de origem pentecostal da primeira metade do séc. XX, que sublinhava e acentuava uma visão escatológica pessimista e um isolamento social, boa parte do que conhecemos como evangélicos nestes últimos 100 anos olhou fixamente para o alto, onde podiam ver as ruas e moradas celestiais, perdendo quase que totalmente o contato com esse chão, negando completamente a ‘cultura secular’; no final das contas perdendo a legítima graça de ser brasileiro, alienaram-se de fato de sua própria brasilidade, abandonando o mundo antes mesmo de partir.

 

Continua…

 

Um brasileiro; Calabar!

Um brasileiro; Calabar!

nov 8, 2011 | 9 Comments

 

Três tiros, três prendas! O pequeno parque na rua da Igreja Matriz oferece até tiro ao alvo, mas um  pouco diferente. A espingarda é de chumbinho, de verdade, e o prêmio não fica preso com cola super-bonder.

A INVENÇÃO DO BRASIL

nov 3, 2011 | 9 Comments

 

Toda criação neste nosso horizonte temporal, aqui, neste chão empoeirado onde  nós pisamos, é feita a partir de algo já pronto, portanto; criar é tecer com os fios coloridos da dádiva!  É organizar materiais, descortinando pré-conceitos, abandonando estes conceitos ultrapassados a medida que estamos mais certos da liberdade. É  ver o antigo atravessando gerações ao ser atualizado por aqueles sujeitos que não desprezam suas raízes mas também não se ocultam diante do novo. Toda novidade, meu leitor, é invenção e essa tal invenção é isso mesmo que acabei de falar.

 

“O mais importante é inventar o Brasil que nós queremos” , determinou com coragem o antropólogo e conselheiro nacional Darcy Ribeiro. Disse isso com dedo em riste, prenunciando um tempo onde nós teríamos a ousadia de imaginar! E o que estamos tecendo com esses inúmeros fios? Com essas brasilidades  a nós apresentadas e aglutinadas nessa sopa cultual que é o Brasil? Muita forma ainda precisa de debate e é por isso que abri esse espaço para palpiteiros de plantão, estudiosos, artistas, professores, intelectuais, religiosos, ateus e desocupados que possam contestar toda essa invenção, como também compartilhar seus caminhos e ideias.

 

Sim! Daqui, deste lugarzinho bem simples onde habito, casado com Débora, amando sua companhia e seu frango com quiabo, correndo de vez em quando na Praia da Costa, rabiscando composições, rodando o Brasil com uma banda de rock, pregando o Evangelho  lá no Templo, fazendo tudo isso em português, em solo brasileiro, como cidadão brasileiro, daqui consigo inventar um país diferente daquele que me deram.

 

Não! Não se precipite em chamar isso de atrevimento descabido. Entro nessa aventura logo depois de rejeitar aquele dualismo hipócrita que dividia o mundo em gospel e secular. Como se isso fosse o mesmo que santo e profano![Pensou que eram sinônimos (?), esquece]Entro nessa depois que gravadoras viciadas naquelas enferrujadas estruturas de mercado me pedirem para ser mais secular (cortando expressões como ‘Tú és’, ‘Deus’ e ‘Senhor’ desse nosso rock brasileiro ‘?’), queriam me inculcar uma auto-censura típica de militares golpistas. Embarco nessa viagem depois de ver que a guerra do movimento gospel já está ganha, apesar de tanto fogo amigo ele conseguiu vencer  seus desafios internos e se mostrou vitorioso principalmente no campo da mídia. Uma guerra que durou pelo menos duas gerações. Hoje, por diversos fatores objetivos apresentados no processo civilizatório brasileiro, na formação   do nosso povo, no amadurecer das nossas explicações para a vida (religião e filosofia), a nossa polivalente geração nasce num outro mundo. Menos distantes, esses espaços antes tão determinados e tão bem repartidos estão mesmo é se misturando. É por isso que consigo imaginar um Brasil onde artistas cristãos recebam sua cidadania artística por causa da sua arte e não por causa da força de um mercado. Onde os parâmetros para classificar sua música sejam musicais ao invés de confessionais –  pois é verdade meu paciente leitor, somente aqui a confissão afro é chamada de brasileira (a famosa Umbanda Music que ampara 90% das letras da MPB contemporânea) mas  a confissão cristã (dos 90% de brasileiros, aquela inacreditável maioria católica e evangélica) é chamada de religiosa – MRB Música Religiosa Brasileira! Encaro esses obstáculos assumindo o conselho do grande Darcy Ribeiro, certo de que um Brasil mais justo na esfera social, mais transparente na sua administração pública, mais próspero economicamente, também deve ser mais cordial e generoso com qualquer um dos filhos, e com qualquer um dos artefatos produzidos por seus filhos, não interessando aqui a sua condição financeira, sua raça, sua  cor ou religião!

 

Sim! É claro que isso não acontecerá através de um decreto constitucional, mas somente quando outros brasileiros sonharem em inventar esse Brasil que acabei de falar. Um sonho só de todos nós.

 

Hoje em Vila Velha.

Marcos Almeida

 

 

Ninguém imaginava

out 13, 2011 | 11 Comments

 

No passado, ninguém imaginava um artista do movimento gospel no Faustão. Ninguém acreditava que esse movimento, que completa quase 40 anos, influenciaria outro ramo pentecostal do cristianismo; a renovação carismática católica. Ninguém imaginava que aquele mesmo mercado que renegou os cantores pioneiros da música evangélica, estaria louvando a força do principal nicho do mercado fonográfico brasileiro. Não só louvando, mas o mercado estaria cantando (ou contando) junto com os artistas os louros da próspera temporada da música religiosa. Ninguém imaginava que a música cristã seria um ótimo negócio. No passado… Sim, passou tanto tempo e precisamos recordar; ninguém imaginava que a explicação evangélica para a vida seria compartilhada por quase 30% da população do nosso país.
Falar de uma nova geração de brasileiros que crêem no Evangelho e que estão influenciando não só a esfera pística (esfera da fé) com teólogos, pastores e padres, mas estão dentro da esfera pública com políticos, assessores, ONGs, entrando nos tribunais com juízes, advogados e promotores. Falar dessa geração que está dentro do Jornal Nacional, da revista Época, da Veja, do quarto poder. Falar da Academia, da Universidade se abrindo para o pensamento cristão reformado, a fim de construir alguma coisa depois da desconstrução total promovida pelos pensadores da 3ª idade que agora se aposentam. Falar dessa geração é considerar que os cristãos dessa terra estão cada vez mais próximos do mundo, mais familiarizados com a rua, mais distantes daquela bolha que nos isolava do cotidiano. O Templo que antes só falava das coisas “do outro mundo” agora produz explicação para a vida prática das ruas, das casas, dos shoppings, a vida prática do Estado, aproximando mais ainda o Céu da Terra, reconciliando os extremos desenhados pela teologia de outrora. Isso vai dá o que falar…

É sobre isso que tanto falo com os amigos mais próximos e agora compartilho em fragmentos aqui no Blog.  Essa imersão no mundo, seja a partir de uma cosmovisão reformada ou pentecostal, traz consigo um movimento que reinterpretará a nossa identidade como povo. As formas de resolver as muitas tensões que surgem desse encontro já estão sendo esboçadas e trabalhadas na rua, na casa, no templo, na academia e nos palácios. Quem tiver ouvidos ouça, pois essa outra brasilidade já está aí!

Hoje em casa.

Abraço demorado.

Marcos Almeida