Canção da mulher grávida – Tasso da Silveira
Tasso da Silveira está de volta ao Nossa Brasilidade com a sua tão musical “Canção da mulher grávida”. Na primeira leitura foi impossível segurar a melodia que intuitivamente ouvia junto a seus versos. Destaquei dois trechos: 1. Sobre o filho que pode vir (e já veio) “abrir caminhos inesperados”, “para encher de alvoroço novo/ a alma triste dos homens”. Coisa linda, não é!? Agora, neste outro trecho ele se dirige a mãe: “Vens fecundada e renascente /com tua alegria tão simples /tão ingenuamente humana”.
É uma canção belíssima de um poeta que certamente tem muito a dizer para nós que estamos redescobrindo as primeiras obras dessa nossa brasilidade tecida na Esperança.
Vens fecundada e renascente
como o trato de terra
que o lavrador semeou.
Teus flancos se arredondam
e teu ventre entumece
em genesíaco esplendor.
Mas a semente do milagre
que em ti pulsa e germina
não rebentará em searas
frescas e verdes, sob o sol.
Frutificará num destino
num prodigioso destino humano,
nas alegrias e nos sofrimentos
de um novo ser, que nasce para Deus.
Vens grávida de um mistério profundo.
Oh, ninguém sabe se teu filho
vai viver a vida obscura e humilde
daqueles que passam como sombras
pela terra
(e que, no entanto, muitas vezes, são claras, lúcidas lanternas ao penetrante olhar de Deus),
ou se vem para abrir caminhos inesperados,
para criar esperanças surpreendentes,
para encher de alvoroço novo
a alma triste dos homens.
Ah, ninguém sabe se teu filho
não virá para desencadear outras tormentas,
para agitar, com mãos possantes,
as águas do oceano trágico,
provocando marés montantes de agonia,
fluxos violentos de aflição.
Houve um ventre, perdido, como o teu,
entre milhões de outros ventres,
e que um dia, no entanto,
gerou Lênin.
Outro que gerou Judas.
Houve um ventre, como o teu, obscuro,
que um dia, no entanto, conteve
são Francisco de Assis.
Houve um ventre humílimo
que um dia gerou Jesus.
Vens fecundada e renascente
com tua alegria tão simples
tão ingenuamente humana.
E não suspeitas que, a esta hora,
todos os astros gravitam
por toda a infinitude dos espaços
em torno do transcendente mistério
do filho que vai nascer….
[Canção da mulher grávida – Tasso da Silveira, in texto introdutório de Amândio César na 4a edição do livro “Cantos do Campo de Batalha”]