MPB é de Eros.
Sensibilidade, doces palavras, interesse na pessoa, não só no corpo; bem vindos ao amor à moda antiga.
É bom lembrar quem é Eros. Eros tem sido caluniado, chamado de careta, de piegas e retrógado. Porque ele significa o amor romântico, o sonho da ‘alma gêmea’, é a simbiose, é o sofrimento por amor, é a dor do apego. É a maneira empolada de falar, jamais usa palavras obscenas e pornográficas. É aquele lugar comum da linguagem romântica, vocabulário batido, é o coração, é a trilha sonora de quem quer levar a amada até o altar, é o pra sempre – é o brega!
VAMOS AO REPERTÓRIO DE EROS
“Mundo moderno, alguém me dizia /’Todo mundo come todo mundo’, / Mas eu tô querendo / Querendo trabalhar meu lado sensibilidade /Agora eu quero só você /Pra gostar de verdade”
– O Novo Namorado (Flávio Basso), 1997
“Mentira dizer que é só transar / Eu sou mais real com seu calor / Os sonhos de quem ama não cabem só na cama / Ninguém transa só por transar”
Transas de Amor (Antônio Cícero e Marina Lima), 1979
Canção meio controversa na história dos irmãos Antônio e Marina, justamente porque eles sempre foram mais de Vênus que de Eros; essa letra aí seria um deslize na carreira deles.
Talvez foi pensando nesse amor menos animal, mais complexo que hormônios e estímulos, estendido para além do leito, que o escritor americano William Tucker disse:
“é a repressão sexual que nos torna humanos”
O professor Guilherme de Carvalho, mais uma vez, nos ajuda a clarear esse raciocínio:
“as pessoas estão no universo do ‘tu’, e não do ‘isso’. Usamos o ‘isso’ para falar dos mundos dos objetos, e o ‘tu’ para o mundo dos sujeitos. E a forma de conhecer cada universo é diferente; o ‘isso’ é conhecido pelo uso; mas o ‘tu’ é conhecido pela comunhão”. (Guilherme de Carvalho)
Entende por que dizemos: “Eros está mais próximo da comunhão e Vênus do uso“?
Um amigo mais velho e sabido nesses assuntos, me lembrou que todos nós, brasileiros religiosos, evangélicos ou católicos, quando pensamos em sexualidade, gozo, prazer, desejo e amor erótico, utilizamos um tipo de programa pirata, um programa mental pirata, corrompido. Não é só o falso pudor que surge como vírus infeliz desse programa pirata; toda nossa visão a respeito do amor e do sexo fica estragada se não limparmos a cabeça e eliminarmos esse programa. (Espero que esses artigos ajudem em alguma coisa nesse sentido). Mas, se você se esforçar um pouco vai entender que Eros é tipo isso: quando vejo a mulher que amo, sou despertado no meu corpo para ver a sua pessoa. Eros é intencionalidade interpessoal. É a paixão que passa pela face – e a face é a expressão primária da consciência, de pessoalidade.
Eu vi quando você me viu
Seus olhos pousaram nos meus
Num arrepio sutil
Eu vi… pois é, eu reparei
Você me tirou pra dançar
Sem nunca sair do lugar
Sem tirar os pés do chão
Sem música pra acompanhar
Foi só por um segundo
Todo o tempo do mundo
E o mundo todo se perdeu
Eu vi quando você me viu
Seus olhos buscaram nos meus
O mesmo pecado febril
Eu vi… pois é, eu reparei
Você me tirou todo o ar
Pra que eu pudesse respirar
Eu sei que ninguém percebeu
Foi só você e eu
Foi só por um segundo
Todo o tempo do mundo
E o mundo todo se perdeu
Foi só por um segundo
Todo o tempo do mundo
E o mundo todo se perdeu
Ficou só você e eu
Quando você me viu…
– Cupido CD “MARIA RITA” – Setembro de 2003
(Claudio Lins)
Na quinta-feira que vem, vamos ver outros exemplos de paixão romântica no repertório popular , quando vou tentar propor algumas conclusões. Se preparem para a dor de cotovelo (Eros maltratado) e um outro tipo muito especial que é Eros tentando ser Agápe, Eros antecipando Agápe, ou Eros dizendo que pode fazer aquilo que só Agápe pode fazer.
Até lá.