10 de Fevereiro / Olavo Bilac

Postado por: em fev 10, 2012 | 1 comentário

Quarenta e um

O Poeta Pop

 

Sua poesia não interessava ao projeto modernista, era vesgo (por isso adotou o pince-nez , para camuflar a vesguice), o mais popular dos parnasianos, um patriota e gênio. Em dois tempos vamos ouví-lo,  primeiro com “a língua portuguesa” depois com o soneto “Inania Verba”. O amor à língua e o grito impotente diante do Absoluto. Com vocês Olavo Brás Martins de Guimarães Bilac:

 

 

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela…

Amote assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: “meu filho!”
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

 (língua portuguesa – Olavo Bilac)

 

 

Ah! quem há de exprimir, alma impotente e escrava,
O que a boca não diz, o que a mão não escreve?
— Ardes, sangras, pregada à tua cruz, e, em breve,
Olhas, desfeito em lodo, o que te deslumbrava…
O Pensamento ferve, e é um turbilhão de lava;
A Forma, fria e espessa, é um sepulcro de neve…
E a Palavra pesada abafa a Idéia leve,
Que, perfume e clarão, refulgia e voava.

Quem o molde achará para a expressão de tudo?
Ai! quem há de dizer as ânsias infinitas
Do sonho? e o céu que foge à mão que se levanta?

E a ira muda? e o asco mudo? e o desespero mudo?
E as palavras de fé que nunca foram ditas?
E as confissões de amor que morrem na garganta?

(Inania Verba – Olavo Bilac)

Guia de Leitura Poética

Postado por: em jan 3, 2012 | 4 comentários

Dez dias de férias no Rio de Janeiro me trouxeram boas ideias e excelentes leituras. Poesia; quis só ela e nada mais! Abrir as páginas de Adélia Prado, reler Mário Quintana, Cecília Meireles, Manoel Bandeira, Drummond, Antonio Cícero… Sim, comprei muitos livros com palavras loucas, imagens únicas – escuridão e clareza numa mistura misteriosa – , confissões escancaradas, sons improváveis e algo que sempre me atraiu para a poesia; sua proximidade com a espiritualidade, aquela vontade de se religar com o Eterno. Daí pensei: por que não ir conhecendo mais desse universo de palavras mágicas? Por que não retomar aquelas antigas leituras que me acompanham desde a adolescência? Por que não ler todo dia uma poesia? Que tal fazer um “Guia de Leitura Poética 2012” ? Um motivo estampado na minha testa: para que a gente se aproxime do  poeta, cujo olhar observa o mundo a partir de outras janelas, as janelas da alma, abertas por outras razões que nenhuma outra literatura sabe explicar porque – nem mesmo a dona teologia, parente bem próximo da linguagem poética, pode tocar onde a poesia toca. Aliás, quando isso acontece, quase sempre o teólogo vira um esteta onde a salvação se torna a beleza e a beleza vira sua religião.

 

Pois bem, resolvi sugerir uma leitura por dia. Uma dieta para a nossa criatividade. Todo dia vou postar aqui no Nossa Brasilidade um poeta do nosso povo. Como já estamos no dia 03 (ãh? acredite) deixarei logo três brilhantes poemas para ficarmos em dia com este delicioso regime de boas surpresas. Alimentação balanceada para a nossa imaginação!

 

Você pode ir recortando e colando no seu caderno de poesia e no final do ano teremos 366 obras de profunda humanidade e honestidade, típicas do lirismo dos verdadeiros poetas.

 

Então, abram as janelas, respirem fundo, tomem seus sustos e deleitem-se a vontade!

 

JANEIRO

                                                           Um

Quem faz um poema abre uma janela.

Respira, tu que estás numa cela

abafada,

esse ar que entra por ela.

Por isso é que os poemas têm ritmo

– para que possas profundamente respirar.

Quem faz um poema salva um afogado.

(Emergência / Mario Quintana)

 

Prêmio Machado de Assis 1980

 

                                                            

                                                        Dois

Me escondo no porão

Para melhor aproveitar o dia

E seu plantel de cigarras.

Entrei aqui para rezar,

Agradecer a Deus este conforto gigante.

Meu corpo velho descansa regalado,

Tenho sono e posso dormir,

Tendo comido e bebido sem pagar.

O dia lá fora é quente,

a água na bilha é fresca,

acredito que sugestiono elétrons.

Eu só quero saber do microcosmo,

O de tanta realidade que nem há.

Na partícula visível de poeira

Em onda invisível dança a luz.

Ao cheiro de café minhas narinas vibram,

Alguém vai me chamar.

Responderei amorosa,

refeita de sono bom.

Fora que alguém me ama,

eu nada sei de mim.

(Tão bom aqui / Adélia Prado)

 

Prêmio Jabuti 1978

 

                                                             Três

Em sua essência, a poesia é algo horrível:

nasce de nós uma coisa que não sabíamos

[que está dentro de nós,

e piscamos os olhos como se atrás de nós

[tivesse saltado um tigre,

e tivesse parado na luz, batendo a cauda

[sobre os quadris.

(Czeslaw Milosz, tradução: Aleksandar Jovanovic)

 

Prêmio Nobel de Literatura 1980