22 de Janeiro / “eu sou brasileiro”
Vinte e dois
O ‘desbocado’ Antonio Carlos de Brito aparece aqui mais comportado do que nunca. Nos versos a seguir, ele toma emprestado o principal tema deste Blog – IDENTIDADE – e em 10 linhas ilustra a afirmação que nos inquieta: “sou brasileiro”. Vamos ouvir:
HÁ UMA GOTA DE SANGUE NO CARTÃO-POSTAL
Eu sou manhoso eu sou brasileiro
Finjo que vou mas não vou minha janela é
A moldura do luar do sertão
A verde mata nos olhos verdes da mulata
sou brasileiro e manhoso por isso dentro
da noite e de meu quarto fico cismando na beira
[de um rio
na imensa solidão de latidos e araras
lívido
de medo e de amor
(HÁ UMA GOTA DE SANGUE NO CARTÃO-POSTAL – Antonio Carlos de Brito )
11 de Janeiro / Antonio Cicero
Onze
Guardar
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fita-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o voo de um pássaro
Do que um pássaro sem voos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guarda-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guardar-se o que se quer guardar.
(Antonio Cicero)
Idealizador do “Banco Nacional de Idéias”, Antonio Cicero é poeta e pensador. Palestrante em vários encontros filosóficos pelo mundo a fora, continua trabalhando a palavra entre o lirismo e a razão, testemunhando que poesia e filosofia moram debaixo do mesmo teto. Sua poética também virou verso de várias canções – mais de 100.